"A literatura tem essa magia de nos tornar contemporâneos de quem quisermos." (Inês Pedrosa)

domingo, 27 de abril de 2014

Invadidos por nós mesmos

"Pode ser que nós, ocidentais de classe média (...), passemos pela mesma coisa por que passaram os índios em 1500. Eles continuam aí, mas o mundo deles acabou em 1500. Se formos falar do fim do mundo, pergunte aos índios como é, porque eles sabem. Eles viveram isso. A América acabou. Pode ser que venhamos todos a ser índios, nesse sentido. Todos venhamos a passar por essa experiência de ter um mundo desabando. No caso deles, eles foram invadidos por nós. Nós também vamos ser invadidos por nós. Já estamos sendo invadidos por nós mesmos. Vamos acabar com nós mesmos da mesma maneira como acabamos com os índios: com essa concepção de que é preciso crescer mais, produzir mais."

Eduardo Viveiros de Castro
Revista Piauí 88, janeiro de 2014, pág. 23

sábado, 26 de abril de 2014

Inumanidade

"A nossa escolha não tem por que ser feita entre socialismos que foram pervertidos e capitalismos perversos de origem, mas entre a humanidade que o socialismo pode ser e a inumanidade que o capitalismo sempre foi."
- José Saramago

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Retrato de um Cadáver

A estratificação social separa e opõe, assim, os brasileiros ricos e remediados dos pobres, e todos eles dos miseráveis, mais do que corresponde habitualmente a esses antagonismos. Nesse plano, as relações de classes chegam a ser tão infranqueáveis que obliteram toda comunicação propriamente humana entre a massa do povo e a minoria privilegiada, que a vê e ignora, a trata e maltrata, a explora e a deplora, como se essa fosse uma conduta natural. A façanha que representou o processo de fusão racial e cultural é negada, desse modo, no nível aparentemente mais fluído das relações sociais, opondo à unidade de um denominador cultural comum, com que se identifica um povo de 160 milhões de habitantes, a dilaceração desse mesmo povo por uma estratificação classista de nítido colorido racial e do tipo mais cruamente desigualitário que se possa conceber. 

O espantoso é que os brasileiros, orgulhosos de sua tão proclamada, como falsa, "democracia racial", raramente percebem os profundos abismos que aqui separam os estratos sociais. O mais grave é que esse abismo não conduz a conflitos tendentes a transpô-lo, porque se cristalizam num modus vivendi que aparta os ricos dos pobres, como se fossem castas e guetos. Os privilegiados simplesmente se isolam numa barreira de indiferença para com a sina dos pobres, cuja miséria repugnante procuram ignorar ou ocultar numa espécie de miopia social, que perpetua a alternidade. O povo-massa, sofrido e perplexo, vê a ordem social como um sistema sagrado que privilegia uma minoria contemplada por Deus, à qual tudo é consentido e concedido. Inclusive o dom de serem, às vezes, dadivosos, mas sempre frios e perversos e, invariavelmente, imprevisíveis. 

Darcy Ribeiro, 
O Povo Brasileiro - A formação e o Sentido do Brasil

terça-feira, 22 de abril de 2014

Maquina Mundana

Willian Ferreira
Afinal de contas, eu tinha feito tudo que me havia proposto na vida. Dera os passos certos. Não dormia na rua. Claro, havia um bocado de gente boa dormindo nas ruas. Não eram idiotas, apenas não se encaixavam na maquinaria necessária no momento. E essas necessidades viviam mudando. Era uma luta desigual, e se a gente dormia na própria cama já era uma preciosa vitória contra as forças. Eu tivera sorte, mas alguns dos passos que dera não os dera inteiramente sem pensar. Em geral, porém, era um mundo horrível, e eu muitas vezes me sentia tristes pelos outros.

Bem, ao diabo com isso. Peguei a vodca e tomei um trago.

— BukowskiI, Charles. Pulp.

domingo, 20 de abril de 2014

Doce Ilusão

Leonid Afremov
Wilhemlm, o que seria de nosso coração num mundo sem amor? O mesmo que uma lanterna mágica sem luz! Mal você coloca a lâmpada lá dentro, aparecem as imagens multicoloridas em sua parede branca! E mesmo que isso não passe de uma ilusão passageira, continuará fazendo nossa felicidade, sempre que estivermos diante dela, como jovens inocentes, encantados com as maravilhosas aparições. 


- J. W. Goethe, 
in Os Sofrimentos do Jovem Werther. 

domingo, 13 de abril de 2014

Mulheres

Edward Hopper - Reclining nude, 1924
"Há mulheres que, por mais que as pesquisemos, não têm interior, são puras máscaras. É digno de pena o homem que se envolve com estes seres quase espectrais, inevitavelmente insatisfatórios, mas precisamente elas são capazes de despertar da maneira mais intensa o desejo do homem: ele procura a sua alma - e continua procurando para sempre." 

Friedrich Nietzsche - Humano, Demasiado Humano,
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