"A literatura tem essa magia de nos tornar contemporâneos de quem quisermos." (Inês Pedrosa)

sábado, 3 de julho de 2010

Despertar

Parece às vezes que desperto
E me pergunto o que vivi;
Fui claro, fui real, é certo,
Mas como é que cheguei aqui?
A bebedeira às vezes dá
Uma assombrosa lucidez
Em que como outro a gente está.
Estive ébrio sem beber talvez.

E de aí, se pensar, o mundo
Não será feito só de gente
No fundo cheia de este fundo
De existir clara e èbriamente?

Entendo, como um carrocel;
Giro em meu torno sem me achar...
(Vou escrever isto num papel
Para ninguém me acreditar...) 

(Fernando Pessoa)

[Imagem: Picasso]

2 comentários:

Richard Mathenhauer disse...

Navegando, este é o segundo poema de Pessoa que vejo postado, felizmente, porque ele é meu favorito (ele e seus Desdobramentos), favorito poeta além-mar.

Tenho um já manuseado livro com sua poesia completa, e estou lá, sempre bebendo da sua embriaguez.

Abraços,

Alan Tykhé disse...

É difícil discriminar no Pessoa, qual poema favorito entre tantos de assombrosa lucidez... embriago-me em suas minuciosas e peculiares poesias que penetram a fundo a alma humana... mas facilmente o discrimino como poeta favorito!

Abraço!

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