"A literatura tem essa magia de nos tornar contemporâneos de quem quisermos." (Inês Pedrosa)

terça-feira, 29 de maio de 2012

Flor do Mal



Gostavas de tragar o universo inteiro,
Mulher impura e cruel! Teu peito carniceiro,
Para se exercitar no jogo singular,
Por dia um coração precisa devorar.
Os teus olhos, a arder, lembram as gambiarras
Das barracas de feira, e prendem como garras;
Usam com insolência os filtros infernais,
Levando a perdição às almas dos mortais.

Ó monstro surdo e cego, em maldades fecundo!
Engenho salutar, que exaure o sangue do mundo
Tu não sentes pudor? o pejo não te invade?
Nenhum espelho há que te mostre a verdade?
A grandeza do mal, com que tu folgas tanto.
Nunca, jamais, te fez recuar com espanto
Quando a Natura-mãe, com um fim ignorado,
— Ó mulher infernal, rainha do Pecado! —
Vai recorrer a ti para um génio formar?

Ó grandeza de lama! ó ignomínia sem par.

- Charles Baudelaire, in "As Flores do Mal" -

Um comentário:

Richard disse...

Meu Caro Filósofo,
Li alguns poemas do Baudelaire, e eles sempre me causaram um incômodo ao mesmo tempo sedutor. Acho que era bem isso que o autor das Flores quis.

Um abraço,

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