"A literatura tem essa magia de nos tornar contemporâneos de quem quisermos." (Inês Pedrosa)

domingo, 26 de maio de 2013

Vida e Morte

A Morte de Casagemas - Picasso
Partiu assim, de repente, sem avisar nem dar adeus. Não deixou um bilhete, também não levou nada. Seu relógio e seu óculos continuam intocáveis na cabeceira da cama, móveis inalterados, paredes intactas, tudo no seu lugar à espera do irretornável.  Era uma cinzenta tarde sábado, numa colisão frontal e um último apelo por Nossa Senhora, que o Sol se pôs mais cedo e não mais retornou. E assim meu pai se foi... para iluminar, talvez, outros mundos. 

Me deparo com o absurdo, o corpo relativamente intacto, porém irreconhecível. Irreconhecível não porque não fosse possível reconhecer a semelhança entre a pessoa a quem pertencia, mas por se parecer com uma cópia barata da vida, mas sem vida. E aquele ser que habitou aquele corpo, mas que também foi corpo por inteiro, desapareceu. E me pergunto incansavelmente pra onde foi?  Se aquela antiga lei de que nada se perde, apenas se transforma, também se aplica à imaterialidade do que somos. Não encontro resposta. E repousa sobre mim o duro fardo, a impossível tarefa que se impõe como um dever absurdo, de resolver este enigma. Como se fosse possível mover a terra de uma possível rota de colisão com algum astro errante. Todo esforço intelectual é inútil. A lógica opera impotente diante do enigma insolúvel da vida e da morte. Talvez o absurdo seja isso, impotência da razão diante do incompreensível. Num último esforço, quero apenas viver sem apelação. 

- Alan Teixeira da Silva

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