"Com uma tal falta de gente coexistível, como há hoje, que pode um homem de sensibilidade fazer senão inventar os seus amigos, ou quando menos, os seus companheiros de espírito?"(Fernado Pessoa)
“A única forma de suportar a existência é mergulhar na literatura como numa orgia perpétua” (Gustave Flaubert)
"Com uma tal falta de gente coexistível, como há hoje, que pode um homem de sensibilidade fazer senão inventar os seus amigos, ou quando menos, os seus companheiros de espírito?"
— Como foi aquela história mesmo?
— Eram 4 terráqueos: Todomundo; Alguém; Qualquerum e Ninguém.
— Isto mesmo! Continua...
— Havia um importante trabalho a ser feito.
— Certo!
— Todomundo pensou que Alguém o faria.
— Qualquerum podia fazer?
— Sim, Qualquerum podia, mas Ninguém fez.
— Ninguém!
— Todomundo sabia que Qualquerum podia fazer, mas Ninguém imaginou que Todomundo deixaria de fazer esperando Qualquerum.
— E dai? Como é que ficou?
— Todomundo culpou Alguém, quando Ninguém fez o que Qualquerum podia ter feito.
(Marcelo Ferrari - Blog)
Afinal, a melhor maneira de viajar é sentir. Sentir tudo de todas as maneiras.
XXI. DAS ILUSÕES
Quando a trôpega velhice coloca os homens à beira da sepultura, então, na medida do que sei e do que posso, eu os faço de novo meninos. De onde o provérbio: Os velhos são duas vezes crianças.
Um grego, de cujo nome não me recordo, era do mesmo parecer, e a sua história é tão engraçada que eu até quero contá-la. Esse homem era louco de todas as formas: desde manhã muito cedo até tarde da noite, ficava sentado sozinho no teatro e, imaginando que assistia a uma magnífica representação, embora na realidade nada se representasse, ria, aplaudia e divertia-se à grande. Fora dessa loucura, ele era, em tudo o mais, uma ótima pessoa: complacente e fiel com os amigos; terno, cortês, condescendente com a mulher; indulgente com os escravos, não se enfurecendo quando via quebrar-se uma garrafa. Seus parentes deram-se ao incômodo de curá-lo com heléboro; mal, porém, ele voltou ao estado que impropriamente se chama de bom senso, dirigiu-lhe esta bela e sensata apóstrofe: “Meus caros amigos, que fizeram vocês? Pretendem ter-me curado e, no entanto, mataram-me; para mim, acabaram-se os prazeres: vocês me tiraram uma ilusão que constituía toda a minha felicidade”.
Sem alegria, a vida humana nem sequer merece o nome de vida!
"Como é bom viver! mas sem sabedoria, porque está é o veneno da vida."...
"Pois bem, quem desejaria sacrificar-se ao laço matrimonial, se antes, como costumam fazer em geral os filósofos, refletisse bem nos incômodos que acompanham essa condição? Qual é a mulher que se submeteria ao dever conjugal, se todas conhecessem ou tivessem em mente as perigosas dores do parto e as penas da educação? Se, portanto, deveis a vida ao matrimônio e o matrimônio à irreflexão, que é uma das minhas esquazes, avaliai quanto me deveis. Além disso, uma mulher que passou uma vez pelos espinhos do indissolúvel laço, e que anseia por tornar a passar por eles, não o fará, talvez, em virtude da assistência da ninfa Esquecimento, minha cara companheira? (...)
"Assim, pois, os filósofos são piores que os fariseus, sobre os quais lemos que impõem pesados fardos, sem eles mesmos erguerem um dedo para levantá-los. Pois isto é o mesmo, pouco importa que não os levantem, desde que possam ser levantados. Mas os filósofos exigem o impossível.
Escrituras de luz investem na sombra, mais prodigiosas que meteoros. A alta cidade incognoscível avança sobre o campo. Certo de minha vida e de minha morte, fito os ambiciosos e tento entendê-los.
Um homem se põe a janela para ver os passantes; se eu estiver passando posso dizer que ele está ali para me ver? Não: pois ele não pensa em mim em particular. Mas aquele que ama uma pessoa por sua beleza a ama? Não: pois a varíola, que matará sua beleza sem matar a pessoa fará com que ele não a ame mais.
E se me amam por meu juízo, por minha memória, amam a mim? Não, pois posso perder essas qualidades sem me perder.
Onde está, pois, esse eu, se não se encontra nem em meu corpo nem em minha alma?
E como amar o corpo ou a alma se não por essas qualidades, que não são absolutamente o que faz o eu, já que elas são perecíveis?
Pois amariam a substancia da alma de uma pessoa abstratamente, e algumas qualidades que nela existissem?
Não é possível e seriam injustos. Portanto nunca se ama a pessoa mas somente as qualidades.
Que não se zombe mais, portanto, daqueles que se fazem homenagear por seus cargos e funções, pois só se ama alguém por suas qualidades de empréstimo.
Apoiando na mão rugosa o queixo fino,
Sorri quando a dor te torturar
... de um modo geral, a tendência do indivíduo é naturalmente em direção à luz, em direção à fonte da luz, como fazem os girassóis num campo.